O Espaço Cultural de Palmas recebe no Theatro Fernanda Montenegro hoje artistas em evento fechado (diz-se por regras sanitárias) para comemorar os 26 anos do lugar. Ainda que a festividade se aproximasse mais de uma celebração.

Acompanhei muito próximo a construção do Espaço. Ainda nas escavações o então prefeito Eduardo Siqueira (eleito com 67% dos votos) levou-me e a outros raros jornalistas da cidade, em 95 (a cidade com menos de 50 mil pessoas) a conhecer o buraco que viria a ser mais tarde o Theatro Fernanda Montenegro.

Apontei, à época, a grandiosidade da obra em contrariedade à miséria da população da cidade que tinha problemas de água, energia (tanto nas oscilações da Celtins como na falta de iluminação pública), esgoto e o desemprego era combatido pela prefeitura com os mutirões que, pejorativamente, criaram a figura do “ôrea seca”.

Era grande o número de invasões de terras por pessoas que viam na mais nova capital do país oportunidade para criar seus filhos, ter sua casa própria e emprego. Aqui chegando, não havia imóveis fáceis (o preço era cotado em dólar) e a pobreza foi levada para os Aurenys e outra parte invadiu as Arnos, destinada inicialmente a grandes mansões, lotes maiores e mais próximos do centro do poder.

 Espaço Cultural e a grandiosidade do teatro eram, assim, sob este ponto de vista, uma provocação, um acinte à pobreza. Se recebeu apoio incondicional dos artistas (e os vereadores não opinavam diferente do prefeito), o gasto calava fundo na maioria, muitos vivendo sob lonas pretas na Sapolândia, Malvinas, Golfo Pérsico, a menos de mil metros do Palácio do governo.

Centenas de operários (os orea seca) cavavam com picaretas valas sob o sol de Palmas que acomodariam canos destinados à condução de água potável às casas. No Espaço Cultural, ao mesmo tempo, também o poder público contratava (a valores vultosos como os aplicados no teatro), à época, uma obra que ficou conhecida como o Jacaré de Siron (Siron Franco). Hoje um amontoado de pedras cangas que a maioria não sabe onde fica nem o que é.

O Espaço hoje é sub-utilizado. Ainda que se possa, nos dias atuais, apontar a virtuose da decisão de Eduardo Siqueira nas suas escolhas ao observar o setor cultural em paralelo às obras de infraestrutura da cidade (acompanhei o prefeito também nas escavações dos túneis debaixo das avenidas, para o esgotamento de águas pluviais), talvez nos quatro anos de Palmas existissem outras prioridades.

Mas o Espaço está aí com suas contradições, um dos maiores da região Norte. Se por um lado leva o nome de José Gomes Sobrinho, um dos servidores públicos estaduais pioneiros na cidade (lotado na Secretaria de Educação), geofísico penambucano, comporta o Theatro com o nome da atriz Fernanda Montenegro (Arlete Pinheiro Monteiro Torres), uma carioca.

Zé Gomes, poeta, com quem tive a oportunidade de conviver (alguns livros ele me entregou para ler em primeira mão, antes de publicar como “Considerações em Dó Furtivo Maior/96), era um fazedor  (e agitador) cultural e que tomou o Estado como sua terra natal.

Assim como Jaime Câmara que dá nome à biblioteca do Espaço (colocou pela primeira vez uma TV no Estado e disponibilizou sua organização na criação do Tocantins). Já a primeira dama do teatro sequer havia pisado em Palmas.

E fazia parte de um pacote de discricionariedades quase obscenas (do ponto de vista histórico da nominação) na cidade como o Relógio do Sol, Memorial Prestes, as esculturas dos Dezoito do Forte, as esculturas das Famílias, o frontispício do Palácio do governo e que tais. Sem qualquer correspondência com a história do Estado.

Ignorando solenemente os antepassados nortenses que deram sustentação a luta da separação por séculos. Preteridos na perpetuação de prédios e instituições públicas, por personagens e personalidades que, se tem o seu valor, não tem nada com a história do Tocantins.

É o típico caso em que o sujeito não interessa ao objeto ou vice-versa.

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