Há uma chiadeira nas redes sociais sobre material publicado ontem, domingo, 28, no jornal o Estado de São Paulo. A reportagem expõe o que considera os contrastes no Tocantins, o paralelismo entre pobreza e riqueza que termina demonstrando um antagonismo do discurso da agenda política e econômica regional. A reação se dá, por impulso, diante do choque da realidade com o discurso oficial (e oficioso), na maioria das vezes fazendo-se uso de mera operação aritmética e estatística.
Um dos argumentos a contrapor-se ao que informa o Estadão, diz-se, é o crescimento da economia tocantinense (do PIB do Estado e das principais cidades). Na verdade, este discurso se encaixa perfeitamente, tanto para quem produz riquezas como para quem dela faz uso político.
O Tocantins por exemplo tem um PIB (soma de
todas as riquezas) de R$ 17 bilhões e 241 milhões (IBGE/2010) e uma população de 1 417 694
habitantes (mesmo referencial). Assim, na aritmética, é um Estado sem
problemas sociais aparentes, onde cada cidadão teria uma renda per capita de R$ 12 mil e 161/ano.
De outro modo: cada morador teria R$ 1.013,00 por mês (1,49 mínimos/mês). Isto
faria da estatística o melhor dos mundos.
Ocorre que os mesmo
números do IBGE revelam também que no Tocantins
50.949 residências têm renda de até ¼ do mínimo, R$ 169,00. Como pelo IBGE cada
família brasileira tem em média quatro integrantes, sobra R$ 42,25 para cada
cidadão sobreviver por mês. Se enquadrássemos isto aí na linguagem cínica que o
governo federal implantou no início do ano (que retirou da extrema pobreza 2,5 milhões de pessoas por entregar o
bolsa família de R$ 71,00) teríamos no Tocantins uma legião de miseráveis (pelo
governo federal pobreza vai de renda R$ 71,00 a R$ 250,00, menos que isto é extrema pobreza) com as 203 mil e 796 pessoas que vivem com R$
42,25/mês : 12,79% da população.
Somando aos 97.727 domicílios que têm renda
entre ¼ e ½ salário mínimo, temos que 148
mil 676 residências vivem com uma renda de até R$ 338,00/mês. Ou melhor
(ops, pior!): 594 mil e 704 pessoas no Tocantins tem uma renda mensal (média)
de R$ 84,50 para sobreviver.
Ainda cotejando números do
IBGE, o Tocantins tem um índice de 34,29% no Mapa da Pobreza e Desigualdades no país. Mais: Dos 139 municípios, 129 têm
população até 20 mil habitantes. Destes, 64,96% na zona urbana onde em 54,22%
dos municípios, a população vive com renda em ¼ de salário mínimo até um
mínimo. Quer mais dados: no índice de concentração de renda, o Tocantins ocupa
(Gini) o índice de (0,507) (o Brasil, um dos maiores concentradores de renda do
planeta possui índice 0,6, numa escala que vai de zero-menos desigual a um-mais
desigual) e 12% de sua população é de analfabetos. Por aqui, a atividade agropecuária contribui
com 1/5 do PIB, sendo que a agricultura representa 12% da produção e a
construção civil, 14% do PIB. As duas
atividades produtivas representam, somadas, pouco mais do que contribui a área
de serviços (especialmente públicos), cuja fatia é de 24% do PIB.
Onde estaria, assim, o erro de O Estadão? O discurso contrário, como se vê, contempla, especialmente, a classe política que pode descobrir na situação oportunidade para desenvolver um discurso patriótico, fundado no desempenho da economia (PIB) que encobre, certamente, as suas deficiências em transformar estas riquezas em distribuição de renda. Contra uma espécie de preconceito do Sul maravilha, naquele surrado complexo de vira-latas. O que não espelha a verdade. Ainda que a maioria das atividades produtivas assim o sejam por incentivadas por benefícios fiscais bancados pelo poder público. E que, pelos dados, ao público não alcance como bem o demonstra a terrível concentração de renda que os números oficiais expõe, que de tão conhecida, a sua contraposição política, tal como se dá, antes de combatê-la, a realça e a defende.
PS: Ainda assim, na relação de PIB/Estados, o Tocantins ocupa a 24ª posição. Só tem um PIB maior que Acre, Amapá e Roraima. E, curioso, como os números, no IDH ele é o 15º (entre 27 Estados) e no índice de concentração de renda está na 18ª posição (0,507). O Estado com maior concentração de renda é o Distrito Federal (0,584) e o de menor concentração é Santa Catarina (0,436). Ou seja, como o índice é "do maior para o menor", apenas oito Estados brasileiros têm uma concentração de renda maior que no Tocantins. Pergunto novamente: onde teria errado o Estadão?