Muita gente reagiu a artigo de ontem sobre a ação do Ministério Público do Tocantins (e do Pará) que se propõe a investigar fato já objeto de denúncia do mesmo MPE do Pará, há três anos. E a dedução de que o novo inquérito se prestava a apenas influenciar no julgamento do mérito do HC de Marcelo Miranda no Tribunal Regional Federal. E que não tem prazo para ser julgado. Marcelo amarga uma prisão preventiva há 16 dias.

Na última decisão (que a defesa entrou no STJ para derrubar a cassação de liminar do TRF), o ministro Reynaldo Fonseca fez de argumento processual (Súmula 691/STF) uma janela para não liberar Marcelo quando a própria legislação o obrigaria como o próprio ministro Reynaldo Fonseca informou em sua decisão citando jurisprudência de HC de sua própria relatoria no STJ:

"Em situações excepcionais, entretanto, como forma de garantir a efetividade da prestação jurisdicional nas situações de urgência, uma vez constatada a existência de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia, é possível a superação do mencionado enunciado sumular".

Excepcionalidades é o que não faltam na prisão preventiva de Marcelo Miranda. Na sentença do juiz federal que a decretou não há comprovação de que Marcelo tenha cometido a prática reiterada de delitos na instrução.

Esse aqui foi o ponto chave da sentença/decreto!!!

Do exame do decreto objurgado, que se vê ás fls. 1593/1707, depreende-se que a custódia cautelar se faz necessária como garantia da ordem publica e da instrução penal, tendo em vista que o depoimento do colaborador, Alexandre Fleury, feito em 29/03/2019, cuja delação foi homologada peto STJ, trouxe à tona a dimensão dos crimes praticados pela organização criminosa, à qual pertencia o paciente, destacando-se, entre os delitos, homicídio, ocultação de bens e disputas de terras. Isto aí é o fundamento da sentença para justificar obstrução de justiça na instrução, único ponto do artigo 312 do CPP (que regulamenta a prisão preventiva) em que poderiam enquadrar Marcelo. Mas que a Justiça o comprova com fato ocorridos há seis anos. Como o leitor já leu aqui e teve acesso aos processos, esse fato ocorreu em 2013!!!!! E já tem denúncia protocolada contra os quatro acusados após investigação do MPE/Pará e a polícia daquele Estado: três PMs e um empregado da fazenda.  O próprio ministro do STJ o reconhece, citando a decisão do TRF fundamentada na sentença da Justiça Federal que decretou a prisão: "Na hipótese vertente, o próprio julgador originário reconhece que os fatos motivadores de sua decisão ocorreram em 2015/2016/2017 e a delação foi homologada ainda no âmbito da instância superior. Os autos desceram em outubro de 2018". Ou seja não há o princípio da contemporaneidade na prisão preventiva, um dos elementos essenciais para sua decretação. Como não observar excepcionalidade numa prisão preventiva fundada em receios e não em comprovação fática e que deveria ser relatada na sentença para justificá-la é assunto que os operadores do direito deveriam requerer respostas dado que podem se confrontar com decisões semelhantes e que certamente terão mais vigor caso não contestadas. Veja trechos da sentença do decreto de prisão: Conforme demonstrado de maneira pormenorizada anteriormente, os indícios apurados em relação às condutas adotadas por MARCELO MIRANDA, BRITO MIRANDA e BRITO JUNIOR revelam o fundado receio de reiteração delitiva, seja em razão da perpetração de atos de lavagem de capitais, cujos indícios apontam estar ainda em curso, seja por operarem um aglomerado de personalidades jurídicas de fachadas". (....) Há, consoante restou salientado pelo Parquet, indícios concretos de reiteração delitiva em um contexto de corrupção sistêmica, o que coloca em risco a ordem pública. No caso em apreço, ademais, os acusados figuram como investigados em diversos inquéritos que tramitam perante esta Vara Federal especializada".  (....)e a comprovação de que os três acusados são afeitos à atos de intimidação, manipulação de provas, coação de testemunhas, e blindagem, dissimulação e ocultação de bens, o que faz exsurgir o delito de lavagem de capitais, de natureza permanente.

 Tudo isto aí sem qualquer comprovação. Até porque no crime de mando (o principal elemento da preventiva) já foi denunciado. E nele os Mirandas não estão como réus. Sequer foram investigados. Daí a pertinência (ou impertinência) da nova ação do MPE/Pará, agora abrindo inquérito para investigar Marcelo e o grupo pelo suposto crime.

Crime de 2013 (com denúncia formalizada em 2016 que não implica os Miranda) que a Justiça Federal do Tocantins viu razões para encarcerar (por obstrução de justiça, usando o crime como prática delitiva comprovada), antes de ser sequer aberto inquérito contra os agora presos,  como elemento para decretar sua prisão preventiva. De outro modo: a nova ação do MPE do Pará, como instrumento de validação da preventiva. Só que depois de decretadas as prisões!!!!

Só deduções. Não se está aqui a defender Marcelo e o grupo ou supostos desvios de recursos públicos. MPF, PF e JF tem por obrigação investigar e punir ladrões de casaca. Mas não pode prender sem que demonstre provas de sua necessidade. Não pode sair por aí gritando: acho que é ladrão e está mandando matar e prender ninguém

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