As redes sociais divididas quanto a termos de uma sentença do juiz Otávio Fraz que veio a público ontem. E não deveria. Ainda que o magistrado possa tê-la redigido na melhor boa fé (e das intenções), é tudo que um magistrado não deveria fazer quanto a método e forma..

Tanto quanto ao respeito à lei processual que concede à parte direito a recursos sem "conselhos" em linguagem imprópria para um juiz, seja pelo tratamento dado à parte que, informe-se, ainda não é condenada em última instância.

Nem assim, seria-lhe permitido a sintaxe chula. Sem juízo de valor do objeto do processo em que o magistrado poderia até carregar razão. Mas juízes são humanos, não à toa a lei processual garante o direito a recursos. E não o juiz.

O Intercept Brasil está aí revelando a cada dia o que ações discricionárias e eletivas de juizes e procuradores depreciam no estado de direito. O direito dependendo mais da vontade política do seu operador, com suas leituras heterodoxas da lei, que do próprio ordenamento jurídico.

E isto deve ser respeitado, é um dos pilares do estado de direito, o direto à defesa, ao contraditório. Não é o juiz que diz se tem ou não direito a recursos. O cidadão pode fazer uso de tantos quantos forem os recursos previsto na lei e o magistrado não tem nada com isto.

De vez em quando magistrados na busca de projeção (porque conhecem muito bem os regulamentos) fazem uso de uma linguagem coloquial em suas sentenças num ambiente em que a formalidade é a regra. Advogado, por exemplo, não pode participar de audiências em mangas de camisa como o juiz o faz em sua decisão.

E o juiz vai mais além: antecipa uma condenação sem sequer conhecer o recurso (não estou dizendo de "conhecer do recurso" e sim "conhecer o recurso" literalmente posto que não tivesse sido ainda protocolizado) que a advogada poderia apresentar:

É o que se deduz explicitamente deste trecho da sentença: "Prepare o recurso, Dra e saia com essa lenga lenga dos maus pagadores de minha porta judicial. Não lhe desejo sucesso."  Um juiz deveria desejar sucesso ao exercício do direito. E não insucesso à parte.

Imagina, um juiz de terceira entrância, como Otávio Fraz, tem um salário bruto mensal de R$ 45 mil pago pelo contribuinte (dentre eles, provavelmente a parte atacada) e, dentre suas prerrogativas não está, certamente, escolher ou recusar processos em suas Varas Judiciais. A não ser que se declare suspeito ou incompetente.

Este outro trecho é eloquente: "Agora a senhora tem que fazer milagres e engenharia processual para tentar defender o indefensável. Desculpe Dra, mas já quase velho, ainda não perdi a capacidade de me indignar com poderosos que massacram os mais simples, com as iniquidades diárias também espelhadas no mundo processual."

Como é notório, a função do magistrado é fazer aplicar a lei. E não ação social. O direito que assiste ao mais rico, assiste ao mais pobre.

E isso aqui!!: " Mantenho o laudo de avaliação apresentado porque corresponde a realidade local. E é ainda até barato considerando a proximidade da capital, não devidamente observado no laudo."

 O juiz está a escrever que não concorda com o laudo técnico mas o aceita. Poderia apenas ter mandado refazer-se o laudo e sentenciar condenando a parte, como parece ser a sua motivação. E chega ao ápice da impropriedade ao dizer-se " processualmente zangado com seu cliente torto".

É possível deduzir que, antecipadamente, o magistrado estaria a dizer que não conhecerá do recurso, ainda que ele não tenha sido protocolizado e dele não conheça os termos.

Não é o que determina a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar 75/79). Escolha aí um dos artigos e observe em qual deles se encaixaria a sentença de Otávio Fraz. Um caso que provocaria, evidentemente, um posicionamento da Ordem dos Advogados do Brasil.

 Art. 35 - São deveres do magistrado: IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência Art. 36 - É vedado ao magistrado:

III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.

Art. 41 - Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir

Art. 49 - Responderá por perdas e danos o magistrado, quando

Il - recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar o ofício, ou a requerimento das partes

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